Ilumencarnados seres

haroldo de campos

haroldo de campos

Depoimentos

Em matéria de recepção do novo o Brasil (e não apenas o Brasil) sempre foi conservador, quando não reacionário diante da informação inventiva, que escapa aos padrões de redundância aos quais o público está habituado e conformado. Considero o movimento tropicalista uma fase muito importante da música popular brasileira, fundamental, por seu contributo em termos de inovação e experimentação.

O disco mais radical, no Tropicalismo, em termos de “canibalização” de experiências, tanto poéticas (letra) quanto musicais (estas nutridas, em parte, nos rumos de invenção da nova música erudita) foi sem dúvida o ARAÇÁ AZUL de Caetano.

Creio que os tropicalistas se informaram, através dos poetas concretos, a respeito de Oswald de Andrade, de Sousândre (o mais radical e inventivo poeta de nosso Romantismo, que Augusto e eu repusemos em circulação) e de outros internacionais como Joyce, Pound, E.E. Cumings, Mallarmé / Un Coup De Dés (todos por nós traduzidos). Também, parece-me, sendo geracionalmente mais jovens, terão recebido influência da teoria e da prática da Poesia Concreta.

O primeiro a entrar em contato com os baianos foi o Augusto que, além de poeta, é musicólogo (vide seu livro pioneiro O Balanço da Bossa) e terá sido o primeiro (ou um dos primeiríssimos) críticos a proclamar e defender a importância dos baianos, em termos de renovação da MPB, através, inicialmente, de artigos em jornais de S.P. e do Rio.

Tive um contato mais estreito com Caetano e Gil, quando eles estavam vivendo em Londres exilados. Fui hóspede deles na “Capela Sixtina” de Chelsea após ter sofrido um acidente de carro. Conversamos muito, li a pedido deles fragmentos das Galáxias, escutei suas composições novas, da fase londrina, e apresentei-lhes Cabrera Infante e sua bela e simpaticíssima mulher e musa Miriam (Caetano leu Três Tristes Tigres em exemplar que lhe emprestei). Desse período datam as reminiscências que, finalmente, redundaram, anos depois no CIRCULADÔ (na canção de mesmo nome, cuja letra é extraída de um texto das referidas Galáxias). Gosto muitíssimo desta canção de Caetano e da maneira como ele montou os fragmentos galáticos.