Ruídos pulsativos

antropofagia

Geléia Geral

Em sua acepção original, “antropofagia” designa as práticas sacrificiais comuns em algumas sociedades tribais – algumas sociedades indígenas do Brasil, por exemplo -, que consistiam na ingestão da carne dos inimigos aprisionados em combate, com o objetivo de apoderar-se de sua força e de suas energias. A expressão foi utilizada metaforicamente por uma das correntes do modernismo brasileiro, querendo significar uma atitude estético-cultural de “devoração” e assimilação crítica dos valores culturais estrangeiros transplantados para o Brasil, bem como realçar elementos e valores culturais internos que foram reprimidos pelo processo de colonização.

“a alegria é a prova dos nove”
Oswald de Andrade

O Manifesto Antropófago foi publicado em São Paulo pelo modernista Oswald de Andrade, em maio de 1928, no primeiro número da “Revista de Antropofagia”. A antropofagia oswaldiana deve ser vista como uma estratégia criativa, cujo intuito era questionar as bases político-econômico-culturais impostas pelo colonizador em nosso meio artístico e intelectual. A reivindicação antropofágica podia ser vista como a metáfora do que deveria ser repudiado, assimilado e superado em favor da independência cultural do País. Dialogando com as vanguardas européias (os “ismos”) e os inúmeros manifestos da época, Oswald vai assumir uma postura radicalmente crítica frente à cultura brasileira. Lança mão da paródia, da blague, do riso, da anarquia para realizar a “canibalização” cultural das nossas fontes primitivas reprimidas (“Tupy or not tupy, that is the question”) e das experiências e informações estrangeiras. A intenção oswaldiana é clara: deglutir a informação que vem de fora e devolver um produto novo e acabado, original, inovador e brasileiro. Nada de “macumba para turista”, como Oswald se referia aos produtos culturais que nada mais eram do que a matéria-prima bruta exportada pelo Brasil. E é com esse mesmo espírito de “canibalismo” cultural e autonomia criativa, deglutindo informações tão díspares como a música pop e o samba, que o tropicalismo vai produzir as suas canções e marcar, de forma original, a sua presença no cenário cultural brasileiro.

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